É POSSÍVEL REVISAR, ALTERAR OU POR FIM AO TAC ASSINADO COM O MPT?
É POSSÍVEL REVISAR, ALTERAR OU POR FIM AO TAC ASSINADO COM O MPT?
Frequentemente sou questionado pelas empresas sobre os Termos de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) assinados com o Ministério Público do Trabalho (MPT), especialmente por empresas que assinaram tal documento há algum tempo. A dúvida é se podem rever os termos de ajuste, seja por mudanças ocorridas na legislação, na negociação coletiva, ou mesmo pelo fato de que a empresa o cumpre a tanto tempo e espera apenas se ver livre das constantes fiscalizações e audiências de acompanhamento.
Minha posição sempre é a mesma: sim, é possível rever os termos do TAC!
Os argumentos a favor dessa conclusão são vários, por exemplo:
Na seara do direito do trabalho, o Tribunal Superior do Trabalho inclusive já se posicionou favorável a possibilidade de revisão dos termos de ajustamento de conduta:
RECURSO DE REVISTA. NÃO REGIDO PELA LEI 13.015/14. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULA DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. PRETENSÃO DE ADEQUAÇÃO À COMPREENSÃO JURISPRUDENCIAL PREVALECENTE. REVISTA DE BOLSAS E PERTENCES DE TRABALHADORES. CLÁUSULA QUE AMPLIA OS PARÂMETROS DEFINIDOS PELA JURISPRUDÊNCIA. PRETENSÃO EMPRESARIAL PROCEDENTE. OFENSA AO ART. 471, I, DO CPC/73 (ART. 505, I, DO CPC/2015). CONFIGURAÇÃO. 1. A Recorrente celebrou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) perante o ministério público do trabalho, no ano de 2004 [...]. Com base na jurisprudência que se consolidou em momento posterior a respeito da proteção patrimonial das empresas, nas relações travadas com seus empregados, propôs a Recorrente a presente Ação Revisional de Cláusula de TAC, postulando a substituição da cláusula I do TAC acima transcrita. Decretada a improcedência da pretensão nas instâncias ordinárias, articula a empresa, em seu recurso de revista, a ofensa aos artigos 471, I, do CPC e 769 da CLT, e 5º, II, XXII, XXXV e LIV, da CF, além de dissenso jurisprudencial. 2. Nas relações jurídicas de trato sucessivo, entre as quais se inserem as constituídas por meio da celebração de um TAC em que previstas obrigações de fazer e não fazer com efeitos permanentes e prospectivos, a alteração do estado de fato ou de direito autoriza a retificação do quanto ajustado, com fundamento no art. 471 do CPC de 1973 (atual art. 501 do CPC de 2015) c/c o art. 769 da CLT. Nesse cenário, se a jurisprudência consolidada no âmbito deste TST, após intensos debates acerca da questão jurídica suscitada - ausência de dano moral em razão de revistas íntimas, realizadas de forma impessoal e discreta, sem contato físico ou exposição da intimidade do trabalhador -, consolidou-se em sentido diverso do que orientou a celebração do TAC, revela-se perfeitamente cabível a revisão do quanto convencionado, assegurando-se a isonomia e a segurança jurídica aos envolvidos e preservando-se a unidade de sentido da ordem jurídica, especialmente no caso concreto, em que postulam incidência, de forma aparentemente antagônica, os incisos X e XXII do artigo 5º da CF. [...] Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. 2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. [...] (RR - 1030-74.2010.5.08.0001 , Relator Ministro: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 16/11/2016, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/12/2016).
No caso, o TAC foi firmado com base na jurisprudência vigente à época de sua assinatura, sendo que tal entendimento jurisprudencial sofreu mudança, assim o TST entendeu que o documento poderia sim ser retificado.
Este é só um exemplo. Se mudança na jurisprudência autoriza alterações no TAC assinado, então mudanças legais também autorizam. Logo, as mudanças ocorridas nos fatos, nas práticas empresariais, estabelecendo novos procedimentos que se distanciam daqueles realizados à época em que firmado o TAC, também podem levar a revisões do mesmo. Nessa linha, posso seguir com várias outras possibilidades.
Outro exemplo que pode ser trazido é o da empresa TRANSUR – TRANSPORTE RODOVIÁRIO MANSUR LTDA. que ajuizou ação declaratória contra o MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 3a REGIÃO, por meio da qual pediu que fosse declarado o término do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado por prazo indeterminado, sob os argumentos de que o TAC teria natureza jurídica contratual, o que permitiria sua denúncia pela parte.
O TRT deu provimento ao recurso ordinário da empresa para declarar o término do TAC, sintetizando suas razões de decidir na seguinte ementa:
TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA - O Termo de Ajustamento de Conduta é instrumento legal sem finalidade punitiva, teleologicamente focado no interesse social a ser protegido. Tem função educativa, de instrução às pessoas jurídicas que se dispõem a cumprir o que determina a lei. Trata-se de um instituto jurídico que soluciona conflitos metaindividuais, firmado por algum ou alguns dos órgãos públicos legitimado para ajuizar ação civil pública e pelo investigado (empregador), no qual se estatui, de forma voluntária, o modo, lugar e prazo em que o inquirido deve adequar sua conduta aos preceitos normativos, mediante cominação, sem que para tanto, a priori, necessite de provocação do Poder Judiciário, com vistas à natureza jurídica de título executivo extrajudicial. Tem plena eficácia, podendo, no entanto, ser desconstituído pela vontade unilateral de uma das partes a qualquer tempo, de modo que, não há norma legal ou contratual que o torne ad eternum, mormente considerando que não se fixou qualquer prazo para a sua validade. (TRT 3aR, RO 176-46.2011.5.03.0143).
Ao analisar o caso o TST afirmou que “É certo que não pode ser atribuído ao TAC, de maneira rígida, efeito ad eternum. Em outras palavras, pode-se admitir a declaração do seu término em hipóteses específicas como, por exemplo, a demonstração da conduta exemplar da empresa que passe a cumprir as obrigações trabalhistas ou a superveniência de situação que o torne inexequível, entre outras, a depender de cada caso examinado”.
Disse mais, ao afirmar que tal “cautela se verifica até mesmo quando o caso é de execução de sentença judicial, nos termos do art. 471 do CPC, segundo o qual, tratando-se de relação jurídica continuativa, se sobrevier modificação no estado de fato ou de direito, poder-se-á pedir a revisão da coisa julgada”.
Não estou dizendo que todas as empresas conseguirão revisar seus TACs ou que basta entrar na justiça para alcançar a revisão. O que precisa ser feito é um trabalho sério de análise do termo de ajustamento, da conduta da empresa, da legislação aplicável, para então decidir-se por questionar ou não o assunto na justiça.
O que ocorre é que as empresas de um modo geral tem receio de questionar o assunto na justiça, temendo reprimendas do MPT, receio este que, considerando as práticas que tenho observado, é justificável, pois ocorre sim retaliação.
Por outro lado, enquanto as empresas não se levantarem e começarem a questionar os TACs firmados, o MPT continuará a agir exatamente como vem agindo: indiferente às mudanças e exigindo obrigações inconsistentes com a realidade fática ou jurídica sobrevinda à assinatura do termo.
É preciso que as empresas tenham a maturidade de analisar sua realidade e a intrepidez necessária para lutar pelo que acreditam ser correto, sem receios das retaliações, ainda que existam, para modificar as obrigações assumidas e agir com a mais ampla liberdade que o direito lhes assegura.